Turismo a favor do planeta

A indústria que mais cresce no mundo pode gerar uma série de impactos sobre o meio ambiente e o modo como vivem as comunidades da região. Por outro lado, encontra-se aí uma grande oportunidade para reduzir a pobreza e preservar a natureza. Governos, organizações civis e empreendimentos estão engajados em mudar o papel deste setor em todo o mundo.

A cada ano, mais de 800 milhões de pessoas circulam como turistas pelo planeta. Nesse vai e vem, estão envolvidos os setores de transporte, hospedagem, alimentação e lazer, além da busca por contato com ícones culturais e com a exuberância da natureza local. Por isso, a indústria do turismo é a que mais cresce no mundo. Só no Brasil, em 2007, enquanto o PIB aumentava em 5,7%, o turismo crescia 10%, chegando a representar 2,6% do PIB ou US$ 39 bilhões. Deste montante, 85% são provenientes do turismo doméstico e 15%, gerados por turistas estrangeiros. Atualmente, o turismo é o primeiro item na balança comercial brasileira - no setor de serviços - e o quinto na pauta geral.

Em 2008, o país recebeu mais de cinco milhões de estrangeiros, que deixaram US$ 5,78 bilhões por aqui, atingindo um recorde histórico desde que o dado começou a ser medido pelo Banco Central. Segundo o Ministério do Turismo, em 2009, a atividade turística internacional teve queda em função da crise financeira. Ainda assim, em janeiro, o gasto dos turistas internacionais no Brasil foi de US$ 492 milhões, número 17,3% menor se comparado ao ano anterior, mas o segundo maior da história.

Além disso, o setor gera um em cada doze empregos – no ano passado, foram 238 milhões de novos postos de trabalho abertos. No Brasil, o investimento necessário para a ampliação de empregos no setor turístico corresponde a um décimo do dinheiro gasto para abrir uma vaga na indústria convencional. Isso sem falar nos estímulos que o turismo gera às outras áreas da economia, como agricultura, pecuária e manufaturas.

Por outro lado, a movimentação de turistas gera impactos sobre a fauna e a flora da região e, também, sobre o modo de vida da população local, o que faz aumentar o consumo exagerado de produtos, bens e serviços. Para evitar que essa interferência acabe por minar a própria indústria do turismo - destruindo os destinos e seus atrativos -, governos têm se preocupado em desenvolver políticas públicas que incentivem práticas sustentáveis para o setor e, nessa onda, muitos fornecedores e empreendimentos têm saído na frente e tomado suas próprias iniciativas para tornar suas atividades mais verdes.

No entanto, é preciso que se tenha clara a definição de turismo sustentável, tanto para garantir a eficiência das medidas tomadas no sentido de promovê-lo, quanto para que os turistas consigam fazer suas escolhas com base em critérios confiáveis, e mesmo para evitar a famosa greenwashing de empresas em que a sustentabilidade não passa de um discurso vazio.

UM CONCEITO PARA A PRÁTICA
Para o Ministério do Turismo, “turismo sustentável é a atividade que satisfaz as necessidades dos turistas e as necessidades socioeconômicas das regiões receptoras, enquanto a integridade cultural, a integridade dos ambientes naturais e a diversidade biológica são mantidas para o futuro”.

Segundo a OMT – Organização Mundial do Turismo, as diretrizes de sustentabilidade são aplicáveis a qualquer forma de turismo e em todos os destinos e devem contemplar aspectos ambientais, econômicos e sócio-culturais. Dessa forma, o órgão define que o turismo sustentável é aquele que:

- faz o uso mais eficiente possível dos recursos naturais, garantindo a manutenção dos processos ecológicos e ajudando a conservar o patrimônio natural e a biodiversidade de cada local;
- respeita a autenticidade sócio-cultural das comunidades anfitriãs, conservando suas construções, sua herança cultural e suas tradições, além de contribuir para o entendimento intercultural e a tolerância;
- garante a viabilidade das operações econômicas, provendo benefícios socioeconômicos para todos os stakeholders de maneira justa e bem distribuída, incluindo empregos estáveis e oportunidades de salários, rendimentos e prestação de serviços sociais para a comunidade anfitriã, colaborando com a redução da pobreza;
- conta com a participação de todos os stakeholders e de uma liderança política forte para garantir que a sustentabilidade faça parte de um processo contínuo, com constante monitoramento de impactos, tomando medidas de prevenção e correção sempre que necessário e
- mantém alto nível de satisfação do turista e garante que a experiência da viagem faça sentido e inclua a preocupação dos mesmos com a promoção das práticas do turismo sustentável.

Com base nesses pré-requisitos, foram definidos, em outubro do ano passado, os Critérios Globais para o Turismo Sustentável, a partir da união de 32 organizações – entre elas a Ong Rainforest Alliance, o Programa Ambiental das Nações Unidas, a Fundação das Nações Unidas e a OMT – que trabalharam juntas para ampliar o entendimento sobre as práticas de sustentabilidade no turismo e tornar esses princípios universais.

Para a definição dos critérios, foram consultados diversos especialistas e observados mais de 60 programas de certificação do setor - entre eles o brasileiro PCTS – Programa de Certificação em Turismo Sustentável. A ideia é contemplar toda a cadeia de valor indo desde os fornecedores até o consumidor final, passando pelos empreendimentos e as agências de viagem.

O documento final está baseado em quatro pilares que exigem um planejamento efetivo de sustentabilidade, a maximização dos benefícios econômicos e sociais para a comunidade local, a redução dos impactos negativos sobre a herança cultural dos destinos e sobre o patrimônio ambiental.

CERTIFICAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS E DESTINOS
Atualmente, existem cerca de 70 programas de certificação de turismo sustentável no mundo e cada um estabelece seus próprios critérios, apesar de todos se basearem no tripé da sustentabilidade: economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente correto. Os selos são concedidos por organizações não-governamentais, empresas privadas ou setores do governo e são úteis aos consumidores que consideram as práticas sustentáveis como um critério para a escolha de seus destinos de viagens.

A Rede das Américas de Certificação em Turismo Sustentável é um dos grupos que possui dez programas de certificação e cerca de 90 membros e tem a intenção de estabelecer ferramentas comuns de trabalho entre eles.

No Brasil, o Programa de Certificação em Turismo Sustentável, que integra a Rede das Américas, trabalha desde 2002 com boas práticas de sustentabilidade no ramo de hospedagens. A iniciativa que começou com o Instituto de Hospitalidade, é gerenciada, desde o ano passado, pela ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas, com base na NBR 15401, em vigor desde outubro de 2006.

Consultores credenciados pelo Instituto de Hospitalidade auxiliam os empreendimentos a implementar os requisitos da norma e fazem o acompanhamento por meio de reuniões técnicas e visitas aos estabelecimentos. Os proprietários e profissionais que trabalham no local que aspira ao selo de certificação são capacitados por instrutores e, por fim, avaliados em relação ao cumprimento de todos os requisitos previstos pela NBR. O processo completo costuma levar cerca de nove meses.

Até agora, 350 estabelecimentos em 21 destinos pelo Brasil foram certificados, servindo como modelo para que a implementação da norma ganhe escala daqui para frente. Uma pesquisa realizada com esses pioneiros revela que a implantação de práticas sustentáveis garante a saúde financeira do empreendimento, gera renda para a população local e preserva o meio ambiente. Para se ter ideia do impacto positivo, veja os dados:

- 81,9% verificaram melhoria dos resultados operacionais e financeiros da empresa;
- 71,5% ampliaram a viabilidade econômica do empreendimento;
- 85% realizaram o plano de negócios da empresa;
- 77% contrataram e treinaram trabalhadores da comunidade local;
- 78% consumiram produtos e serviços da comunidade local;
- 83,3% aumentaram a qualidade no atendimento e obtiveram mais satisfação dos clientes.

De acordo com José Wagner Fernandes, gestor de Certificação da ABNT, a intenção é de que, no futuro, a NBR15401 possa contemplar não apenas o setor de hospedagens, mas, também, outros segmentos como os de transporte, alimentação, agenciamento e eventos.

José Wagner reconhece que a certificação ainda não é um fator determinante para as escolhas dos turistas, mas percebe que o turista europeu já dá sinais de que é mais simpático a locais certificados. “Hoje, os empreendimentos fazem o caminho da certificação porque se não for assim, daqui a pouco não tem mais a praia, o rio, o clima, a cultura, seja o atrativo que for. Se eles não cuidarem, o negócio acaba”. O gestor de certificação ainda observa que não adianta um estabelecimento fazer a sua parte se os demais - localizados no mesmo destino - não o fizerem e que, mais do que um diferencial, o turismo sustentável deve ser um pré-requisito.

Por Thays Prado
Edição: Mônica Nunes
Planeta Sustentável - 08/07/2009

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